
Thierry Gueorgiou tem 28 anos. “Stéphanois” [“de Saint Étienne”, N. de T.] acima de tudo, Tero constitui também, sem sombra de dúvida, uma referência no pequeno mundo da corrida de orientação. A razão é simples: neste domínio, ganhou tudo o que havia para ganhar.
P. - Thierry, podes recordar-nos o teu palmarés?
R. - Pentacampeão do Mundo, tetracampeão europeu e líder do “ranking” mundial.
P. - Creio que venceste, igualmente, os Campeonatos Mundiais Militares…
R. - Sim. Desde 2006 que tenho um contrato particular com a “Gendarmerie” [“polícia”, N. de T.] Nacional, representando-a nas competições internacionais. Normalmente, deveria estar em Maison Alfort, na região parisiense, mas fui destacado a tempo inteiro para Pôle France de Saint-Étienne, a estrutura de treino da Federação.
P. - E há quanto tempo te profissionalizaste?
R. - Desde 2004. Estudei Etologia Aplicada na Universidade de Saint-Étienne. A Etologia é o estudo do comportamento animal. É uma formatura pouco comum em France, existe apenas em duas ou três cidades. Diplomei-me e estava determinado a exercer a minha profissão neste domínio como gestor dum Parque Nacional, por exemplo. Mas tive de relegar o projecto para segundo plano, já que a minha actividade desportiva obrigava-me a passar dois terços do meu tempo fora de Saint-Étienne, dos quais uma boa parte no estrangeiro.
P. - Uma palavra sobre o NOSE?
R. - É o meu clube, “Nature Orientation Saint-Étienne”. Foi fundado em 1975 e conta com uma centena de federados. Conquistou o título de Campeão de França de clubes em 2007 e uma dezena dos seus orientistas foram seleccionados para representar o nosso País, nomeadamente François Gonon. Faço parte do clube desde 1984. Os meus pais tinham na altura cargos de direcção. A minha mãe era a Presidente e o meu pai o Treinador.
P. - O que é que te agrada na corrida de orientação?
R. - Trata-se de um desporto completo. Há todo o aspecto físico, o treino de campo que se aproxima do treino dum maratonista. E há, claro, o aspecto mental, que desempenha um papel fundamental, a leitura dos mapas, o contra-relógio… É também o desporto de natureza por excelência. Saímos realmente dos trilhos balizados para penetrarmos no coração da floresta. Cada dia é uma nova aventura. Daquele que se inicia na Orientação ao mais consagrado dos praticantes há todo um mesmo espírito de liberdade, de fazer a sua própria escolha do melhor itinerário. No Atletismo, por exemplo, a volta à pista terá sempre 400 metros, quer seja aqui ou no Japão. Na nossa disciplina, esta noção de distância tem muito pouco significado. Tanto podemos fazer 10 quilómetros numa hora e meia como em quarenta minutos. E depois, na corrida de orientação, nunca encontraremos duas florestas parecidas. É o eterno recomeço. Na Austrália ou no Pilatus (Suiça), no Japão ou na Escandinávia, é necessário que nos adaptemos a cada local, não há lugar a repetições…
P. - Queres explicar-nos o essencial da corrida de orientação?
R. - É muito simples. Cada corredor possui uma bússola e um mapa à escala de 1/10 000 que, contrariamente a um mapa normal, contém uma enorme diversidade de detalhes acerca do relevo, do terreno, as rochas e muito mais. A partir do momento em que se põe em marcha o cronómetro, o orientista deve efectuar um trajecto seguindo os pontos de passagem obrigatórios. Estes pontos estão assinalados sob a forma de uma baliza em tela, de 30x30 cm, e a passagem deve ser validada por um sistema de “picotagem” electrónica. O objectivo consiste em fazer o percurso ao longo das várias balizas o mais rapidamente possível. Mas entre cada ponto de passagem, a escolha do itinerário fica ao critério de cada um. O percurso em linha recta, evidentemente, nem sempre é o mais rápido. É necessário jogar com as inflexões do terreno, os lagos e outros acidentes… O tempo gasto a percorrer o traçado da corrida depende, sobretudo, do meio sobre o qual a mesma se desenrola. Em terrenos como na Finlândia, onde o relevo é mais duro, numa mesma distância teórica poderemos gastar quase o dobro do tempo que gastaríamos num terreno plano. As corridas são individuais mas existem igualmente provas de estafeta, com equipas de três elementos.
P. - Qual é a grande dificuldade na prática desta disciplina?
R. - O conhecimento do relevo. É necessário aprender a imaginar um terreno a três dimensões sobre o mapa. Claro que não é apenas isto. Apercebo-me que as mulheres parecem ter mais dificuldade em possuir esta visão a três dimensões, mesmo se conseguem compensar esta insuficiência com outras qualidades, nomeadamente a atenção. Mas nem todos os homens possuem igualmente esta capacidade mental. Como na generalidade dos desportos, é necessária uma longa aprendizagem onde o treino técnico, a vivência de situações as mais variadas e o número de florestas “visitadas” desempenham um papel fundamental. É à medida que o tempo passa que o orientista aprende a adaptar o seu comportamento e a reagir cada vez mais rapidamente.
P. - Evocas imenso a Escandinávia. A Orientação é muito praticada nesses países?
R. - Absolutamente. Foi ali que ela nasceu há uma centena de anos, na Noruega, e a Escandinávia constitui a “Meca” de todos os corredores de orientação. As melhores competições é aí que têm lugar, desenrolando-se através de paisagens magníficas…
P. - Fala-nos do teu programa para 2008.
R. - Os Campeonatos da Europa na Letónia, em Maio, e os Campeonatos do Mundo em Agosto, na República Checa.
P. - Não sentes alguma decepção pelo pouco interesse que a comunicação social demonstra pela Orientação e pelas tuas “performances”?
R. - É uma questão que me coloco frequentemente. A minha vida seria diferente com uma maior mediatização. A título pessoal, teria mais facilidades pecuniárias, mas ganho o suficiente para efectuar os meus estágios e conseguir fazer tudo aquilo que gosto. E depois, por outro lado, digo a mim mesmo que o espírito da corrida de orientação é o de permanecer livre. É um desporto ainda preservado de certas polémicas, “doping” e outros malabarismos, daí que não seja mau de todo que ele permaneça “confidencial”. De qualquer das formas, não me lamentarei quando puser fim à minha carreira.
P. - Última questão: Não te aborrece o facto de teres conquistado tudo?
R. - Não. Ter sido Campeão do Mundo em 2003 foi o realizar dum sonho de miúdo. E logo após percebi que, afinal, não tinha nada de extraordinário. O que conta não é o medalhão à volta do pescoço, é tudo o que está por detrás disso: a preparação, a descoberta, a competição. De cada vez é uma nova história que se escreve. É nisto que reside a beleza da Orientação…
(Entrevista conduzida por Hervé e que pode ser vista na versão original, aqui.)
Para saber mais sobre Thierry Gueorgiou visite o seu excelente "site" em http://www.tero.fr/ .
Saudações orientistas.
JOAQUIM MARGARIDO